Não permitas que eu me desvie!

«Aquele que transforma os lábios dos homens verazes e rouba aos velhos a sua ciência» (Job 12,20). Quando o sacerdote não pratica o bem que prega, é-lhe retirado o próprio dom da palavra, para que não cometa a afronta de dizer o que não põe em prática, segundo as palavras do profeta: «Ao malfeitor, porém, Deus diz: “Que mais te dá repetires tanto os meus preceitos e trazeres sempre na boca a minha aliança?”» (Sl 49,16). Daí também esta súplica: «Não retires jamais da minha boca a palavra da verdade» (Sl 118,43). Ele sente profundamente que Deus Todo-Poderoso concede a palavra da verdade a quem a vive e a retira a quem não a vive. Por isso, aquele que pedia que não lha tirassem da boca, pedia a graça das boas obras, como quem diz abertamente: não permitas que eu me desvie das boas obras; se eu perdesse a ordem de uma vida santa, perderia a retidão da minha palavra. Muitas vezes, quando um médico se põe a ensinar o que não quer fazer, deixa de ter palavras para dizer o bem que desprezou praticar, e ensina aos seus alunos os erros da sua conduta. No justo juízo de Deus Todo-Poderoso, deixou de ter a língua ao serviço do bem, pois recusa-se a viver bem; a sua alma abrasou-se de amor pelos bens da terra e é dos bens da terra que doravante falará sempre. Por isso, a verdade diz no evangelho: «É da abundância do coração que a boca fala. O homem bom do bom tesouro tira coisas boas, e o homem mau do mau tesouro tira coisas más» (Mt 12,34-35).

São Gregório Magno (c. 540-604) papa, doutor da Igreja

Livro XI, SC 212

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