«Não vim revogar, mas completar»

São João Paulo II (1920-2005) papa
Discurso na sinagoga de Roma, 13/04/1986

A minha visita hoje [a esta sinagoga] pretende constituir um contributo decisivo para a consolidação dos laços que unem as nossas comunidades. […] De entre as múltiplas riquezas da declaração «Nostra aetate», do II Concílio do Vaticano, […] a primeira é a de que a Igreja de Cristo descobre os seus laços com o judaísmo sondando o seu próprio mistério («Nostra aetate», 4). A religião judaica não nos é extrínseca, mas, de certo modo, intrínseca. Temos com ela um relacionamento que não temos com nenhuma outra religião. Sois os nossos irmãos preferidos e até, podemos dizê-lo, os nossos irmãos mais velhos. […] O caminho que começámos a trilhar está ainda no início; será preciso ainda muito tempo […] para que todas as formas de preconceito, mesmo que inconsciente, sejam suprimidas, e […] possamos mostrar o verdadeiro rosto do judaísmo, bem como o do cristianismo. […] Não é segredo para ninguém, desde o princípio, que a nossa divergência fundamental é a nossa adesão, como cristãos, à pessoa e ao ensino de Jesus de Nazaré, filho do vosso povo, do qual saíram igualmente a Virgem Maria, os apóstolos, alicerces e colunas da Igreja (cf Gal 2,9), e a maioria dos membros das primeiras comunidades cristãs. […] Outro tanto se diga das vias abertas à nossa colaboração, que, à luz da herança comum saída da Lei e dos profetas, são diversas e importantes […]: acima de tudo, a colaboração em favor do homem […], da sua dignidade, da sua liberdade, dos seus direitos, numa sociedade […] onde reine a justiça e […] prevaleça a paz, essa shalom desejada pelos legisladores, pelos profetas e pelos sábios de Israel. […] Que desta visita, da concórdia e da serenidade que já conseguimos, nasça uma fonte fresca e benfazeja que nos ajude a sarar as feridas desta nossa cidade de Roma, como o rio que Ezequiel viu sair da porta leste do Templo de Jerusalém (cf Ez 47,1s). Assim, conservar-nos-emos, de parte a parte, fiéis aos nossos compromissos mais sagrados, mas também a tudo o que nos une e aproxima mais profundamente: a fé num só Deus, que ama o estrangeiro e faz justiça ao órfão e à viúva, ensinando-nos a amá-los e a socorrê-los (cf Dt 10,18; Lv 19,18.34). Foi precisamente do Senhor da Tora, aqui venerado, que os cristãos aprenderam essa vontade, a vontade de Jesus, que levou às últimas consequências o amor por ela exigido.

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